LIVROS - 7-04-09
O que ler para entender Darwin nos seus 200 anos
Charles Darwin talvez tenha sido o cientista que mais mexeu na forma como vemos a vida e o mundo à nossa volta. Apesar dos 200 anos completados esse ano, o autor de "A Origem das Espécies" continua ativo - e como!
A palavra darwinismo, usada correta ou abusivamente, virou moeda corrente em qualquer discussão sobre a evolução da vida na Terra. Em alguns meios, especialmente os religiosos e/ou criacionistas, chega a ser sinônimo de ateísmo. Pois, se Copérnico tirou nosso planeta do centro do universo, Darwin rebaixou o homem de sua patente divina, revelando sua ascendência animal.
Muitos livros tentam compreender esse sujeito tímido, hipocondríaco e cheio de reservas, mas que ousou abalar para sempre os alicerces da chamada civilização. E nenhum deles parece mais completo do que a volumosa biografia escrita pelos estudiosos Adrian Desmond e James Moore, já na quinta edição (Geração Editorial).
O livro, cujo apropriado subtítulo é "A Vida de um Evolucionista Atormentado", detalha, com linguagem cativante, não apenas as descobertas de Darwin, como descreve a mutante sociedade vitoriana em que vivia, imersa em intolerância moral e religiosa, mas também em convulsões sociais e calorosos debates científicos e progressistas. E retrata o homem Darwin, com suas fraquezas e conflitos internos e sua enorme relutância em confrontar o mundo com idéias ousadas demais.
O próprio Darwin se via como um "capelão do demônio" e sentia-se "confessando um crime" ao sugerir que moluscos acéfalos e hermafroditas seriam os ancestrais da humanidade.
Quem quiser, no entanto, um resumo consistente da evolução das idéias do grande cientista pode começar com o simpático "As Dúvidas do Sr. Darwin", do americano David Quammen (Companhia das Letras). Conciso, ensaístico e mais autoral do que erudito, o livro trata do período posterior à famosa viagem a bordo do Beagle pela América do Sul e Galápagos. Quammen preferiu concentrar-se nas viagens feitas por Darwin dentro de sua própria cabeça, mostrando como ruminou por 20 anos (!) até sentir-se preparado para lançar sua bomba devastadora, na forma do livro "A Origem das Espécies".
O autor parece conhecer bem o assunto e recheia cada página com anedotas saborosas, sem nunca perder o fio da meada teórica. Faz, por exemplo, com que pesquisas com cracas e minhocas tenham sabor de enredo policial. Outra qualidade de seu livro é expor claramente as críticas severas que Darwin recebeu, assim como os apoios fundamentais que teve, tecendo uma espécie de romance científico, com vilões de grossas sobrancelhas e dedos em riste e mocinhos corajosos (como Wallace, "co-autor" do conceito de seleção natural), dispostos a enfrentar a opinião pública com suas idéias avançadas.
Um excelente complemento para essa leitura é "Aventuras e Descobertas de Charles Darwin a Bordo do Beagle", de Richard Keynes (Jorge Zahar). O livro, de tamanho generoso, relata as exóticas incursões de Darwin por florestas tropicais e inóspitas regiões vulcânicas.
Recheado pelas belas ilustrações de Conrad Martens, colega de Darwin no Beagle, traz ágeis descrições das pesquisas de campo feitas por Darwin na Bahia e Rio de Janeiro; na Patagônia e ilhas Galápagos, sempre que possível reproduzindo notas, trechos de livros, cartas, diários e cadernos do próprio cientista, ele mesmo um ótimo escritor. Pelo livro ficamos sabendo do horror de Darwin à escravidão, de sua reação diante dos selvagens da Terra do Fogo, de suas observações geológicas durante um terremoto avassalador, de como teve de lidar com guerras e conflitos com índios no Uruguai e na Argentina, das descobertas de fósseis gigantes e gigantescas tartarugas, entre outros espécimes curiosos, e de como adotou uma percepção em tudo pioneira da hoje conhecida ecologia.
Há ainda uma ótima biografia do livro "A Origem das Espécies", escrita por Janet Browne, da Jorge Zahar. Entre as curiosidades, conta como o livro, lançado em 1859, teve sua primeira edição esgotada em um só dia. Conta também que, ao contrário do que muita gente pensa, o livro não menciona em nenhum lugar que o homem descende dos macacos. Essa conclusão aparece apenas em 1871, no seu estudo "A Descendência do Homem", em que cunhou nova idéia revolucionária: a seleção sexual. Esse livro foi completado por outro, bastante curioso, que agora está sendo relançado em formato de bolso: "A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais" (Companhia das Letras). Para quem tem pouco tempo, recomenda-se "Darwin e a Evolução em 90 minutos", de Paul Strathern (Jorge Zahar). É bem curtinho, mas dá o recado.
E afora os excelentes livros dos darwinistas de carteirinha Ernest Mayr, Richard Dawkins e Stephen Jay Gould, há também no mercado alguns volumes que tratam da influência de Darwin hoje nas ciências e também no dia-a-dia. Dentre esses, pode-se destacar "Charles Darwin em um Futuro Não Tão Distante", uma compilação de palestras de estudiosos preparada pelo Instituto Sangari especialmente para o bicentenário do cientista; e "O Espectro de Darwin - a Teoria da Evolução e Suas Implicações no Mundo Moderno" (Jorge Zahar). Quem quiser se aventurar no próprio "A Origem das Espécies", há pelo menos três edições diferentes: da Martin Claret, da Itatiaia e da Editora Escala.
Por último está no ar um completíssimo site com bibliografias online, sugestões de pesquisa e notícias montado também para esses 200 anos do "capelão do demônio", aqui.
DANIEL BENEVIDES
DANIEL BENEVIDES
Colaboração para o UOL
Marcadores: Livros
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