ENTRESSEIO

s.m. 1-vão, cavidade, depressão. 2-espaço ou intervalo entre duas elevações. HUMOR, CURIOSIDADES, UTILIDADES, INUTILIDADES, NOTÍCIAS SOBRE CONSERVAÇÃO E RESTAURO DE BENS CULTURAIS, AQUELA NOTÍCIA QUE INTERESSA A VOCÊ E NÃO ESTÁ NO JORNAL QUE VOCÊ COSTUMA LER, E NEM DÁ NA GLOBO. E PRINCIPALMENTE UM CHUTE NOS FUNDILHOS DE NOSSOS POLÍTICOS SAFADOS, SEMPRE QUE MERECEREM (E ESTÃO SEMPRE MERECENDO)

20 janeiro, 2010

CULTURA, PATRIMÔNIO CULTURAL E HISTÓRICO - 20-1-10

Imagem rara de santa grávida é recuperada em Paraitinga (SP)

Parece notícia de tabloide: santa grávida de barro é encontrada com o rosto intacto sob os escombros de capela. Mas o caso aconteceu em São Luiz do Paraitinga (182 km de São Paulo. Uma imagem de barro de Nossa Senhora das Mercês, cujo ventre proeminente sugere gravidez, foi encontrada com a face intacta sob os escombros da capela homônima, destruída pelo temporal que devastou a cidade.
A parte inferior da imagem, inclusive a barriga, esfacelou-se, mas deve ser restaurada. A santa tem mais de 200 anos, foi levada para a cidade por uma mineira de Caetés em 1809, cinco anos antes da inauguração da capela, e é raríssima.



"Não conheço nenhuma outra imagem da virgem das Mercês grávida, se é que ela está grávida", diz a historiadora Myriam Ribeiro, professora aposentada da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e uma das maiores especialistas em barroco brasileiro. Existem duas santas que costumam ser representadas grávidas: Nossa Senhora do Ó e Nossa Senhora da Boa Expectação.
Santas grávidas são uma herança da Idade Média, quando os fiéis tinham um convívio mais íntimo com as imagens sacras e costumavam representá-la como pessoas comuns. O Concílio de Trento, realizado entre 1545 e 1563, acabou com essa tradição e vetou, por exemplo, as imagens do Cristo nu na cruz, segundo Myriam.
A historiadora Olga Rodrigues Nunes de Souza, que cuida do acervo da cúria de Taubaté, diz que tudo conspirava para que a imagem estivesse destruída. "A terracota da santa não era bem cozida. Todo mundo achava que a imagem iria desintegrar na água. Achá-la com o rosto bom é o que o povo costuma chamar de milagre", diz.
A santa e o vazio
A santa foi encontrada por uma equipe comandada por José Carlos Imparato, professor de odontologia da USP e arqueólogo nas horas vagas.
Imparato, que tirou licença para fazer as buscas em Paraitinga, tem uma casa de veraneio a cerca de 50 metros da capela e, quando a água começou a invadir a cidade, cogitou pegar uma canoa para tirar a imagem do altar. "Mas fiquei com medo que me confundissem com um saqueador", relata.
Pediu, então, a um garoto que checasse se a imagem estava segura. O garoto entrou de canoa na capela, viu que a imagem não fora atingida pela água e resolveu deixá-la por lá. Isso aconteceu no dia 1º de janeiro. No dia seguinte a capela estava no chão e a imagem sumira.
A santa foi encontrada no segundo dia de buscas na capela, em 4 de janeiro, por volta das 11h. "Achei, achei, achei", gritou Luiz Antonio Veriato, voluntário nas buscas que trabalhara no restauro da capela que ruiu. A imagem foi salva por um golpe de sorte, segundo Imperiato. "Ela estava deitada sobre três pranchas de madeira. Tinha uns 20 centímetros de barro e de madeira sobre ela, mas havia uma lacuna, um vazio, na parte do rosto. Quando vi o rosto intacto, o manto e mãos em bom estado, não acreditei".
Amanhã, Wivian Diniz, gerente do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) de bens móveis, vai a Paraitinga verificar o que fazer com a imagem.
O plano do Iphan é entregar a imagem para João Dannemann, professor da Universidade Federal da Bahia da disciplina conservação e restauração de obra de arte. "A ideia é reconstruir a santa porque é uma obra de caráter devocional", diz. "O fiel não aceita peça devocional sem um pedaço do corpo. Se fosse obra de museu, ela poderia ser restaurada sem um braço, por exemplo."
Dom Carmo Rohden, bispo de Taubaté, conta que dez dias antes da enchente tentou tirar a imagem de Paraitinga.
"Não porque eu previsse a catástrofe, mas porque ela ficaria melhor no Museu de Arte Sacra de Taubaté e temos que zelar pela nossa arte sacra. Se eu fosse ditador, a imagem estaria salva, mas não tenho vocação para Hitler. O padre local disse que a população venera a Nossa Senhora das Mercês e eu aceitei o argumento dele".
Cerca de 250 livros com a história das irmandades de Paraitinga, duas imagens do início do século 18 e um paramento com aplicações em ouro foram salvos das águas porque o museu levou-as para Taubaté.
O dentista que comandou as escavações em que as imagens foram achadas diz que a saída da imagem de Paraitinga seria uma "catástrofe". "A recuperação dessa imagem é o ressurgimento da cidade para os moradores. Ela não pode sair daqui."
MARIO CESAR CARVALHO



Irritada com atraso em obra, prefeitura de São Paulo tenta abafar descobertas arqueológicas
A entrada de jornalistas ou de câmeras está proibida pela Emurb (Empresa Municipal de Urbanização). E os arqueólogos foram advertidos para não darem entrevista. No lugar de exibir os achados que revelam o passado de São Paulo às vésperas de seu 456º aniversário, a prefeitura paulistana prefere silenciar sobre os trabalhos arqueológicos que estão sendo feitos na reurbanização do largo de Pinheiros para receber uma estação de metrô.
"A cidade obedece ao mercado. A modernização de Pinheiros tem o desenho da especulação imobiliária. A reforma não é para a população do bairro. Por isso, é mais fácil desqualificar como caquinhos os objetos encontrados, de clara importância histórica", opina o arqueólogo Paulo Zanettini, sócio de uma empresa de resgate arqueológico e especialista nos sítios paulistanos.
Já foram encontradas louças holandesas, francesas e inglesas, bem como garrafas do século 19, mostrando que a vocação comercial da área é antiga. Mas a única forma de saber isso é passar na calçada esburacada no número 700 da rua Fernão Dias. Lá, espremidos entre tábuas de madeira compensada e os pontos de ônibus para Cotia, dois cartazes contam o que acontece ali.
Os pedestres passam sem parar para ler sobre o aldeamento que os jesuítas fizeram na área até 1640 com os índios guaianás, nem sobre as porcelanas Maastrich ou Sarreguemines usadas pelos habitantes do passado. É fácil ver as placas publicitárias de "compra-se ouro" ou "exame médico demissional" que se espalham pelo largo.
O pano de fundo do ocultamento do resgate arqueológico é o atrito entre a Prefeitura de São Paulo e o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Uma denúncia anônima ao órgão vinculado ao Ministério da Cultura fez as obras de Pinheiros pararem em meados de novembro.
Vestígios do passado


Pedestre passa diante de cartaz com achados no sítio urbano



Pedaço de faiança inglesa desenterrada em Pinheiros



Caco de garrafa achada nas obras de futura praça de estação

Desde 2002, toda a obra de porte em região de potencial histórico deve ser inspecionada por especialistas, assim como acontece com o obrigatório relatório de impacto ambiental. Isso é determinado pela portaria federal 230. Pela extensão e localização, a reurbanização de Pinheiros, que inclui mais de uma dezena de quarteirões, entra facilmente no caso.
A Emurb, por meio de sua assessoria de imprensa, disse que não conhecia essa legislação. A arqueóloga Luciana Juliani, proprietária da empresa de prospecção A Lasca, diz acreditar que a empresa não agiu errado. "A Emurb achou que não estava agindo mal porque não foi cobrada antes", afirmou.
Um mês depois de parte das obras pararem para o resgate histórico, porém, a prefeitura convocou jornalistas para desqualificar os objetos encontrados, apontando que não passavam de pedaços de ossos, ferraduras e utensílios domésticos dos anos 1950, desgastados pelo tempo e sem valor histórico. O arqueólogo responsável, Plácido Cali, saiu prontamente para desmentir, mostrando achados de dois séculos atrás. E a tendência é achar coisas mais antigas, afinal, a cada 50 centímetros para baixo se recua um século.
"É por desconhecimento que se julga que a arqueologia existe para descobrir civilizações e múmias. Os grandes achados são raros. Nossa função é revelar como era o cotidiano do passado", disse Luciana Juliani.
Zanettini concorda com ela. "A arqueologia revela a história que foi esquecida, a história das pessoas comuns, não aquela contada nos livros de história, que relata bem só a elite de poder. Os cacos que a gente encontra falam de um cotidiano que as fotos e os textos não revelaram."
E o sítio de Pinheiros foi revelador, com um depósito de garrafas enterradas que apontam a presença por ali de uma taberna do início do século 19.
É sintomático que a revitalização da área queira apagar as pessoas comuns do presente e do passado. O novo desenho do local será elo para o eixo endinheirado que une bairros como Brooklin, Itaim e Jardins ao Alto de Pinheiros, Alto da Lapa e Vila Madalena.
O plano do prefeito Gilberto Kassab (DEM) era inaugurar a primeira parte do novo largo em julho de 2010, mas os arqueólogos acreditam que as escavações podem acabar só no final do ano.
Tendo como pano de fundo as eleições gerais deste ano, há quem veja um embate político no embargo do Iphan. A postura da Emurb de tentar abafar o assunto mostra o tamanho do desgaste que a polêmica causou para a prefeitura, para Kassab e para seus aliados políticos, afinal, a reurbanização de Pinheiros seria inaugurada simultaneamente com a estação de metrô Faria Lima - que deve sair há tempo de ser exibida no horário político dos candidatos envolvidos com a obra.
E na futura praça do largo de Pinheiros não espere referência aos achados arqueológicos. Afinal, a tradição de São Paulo é erguer uma cidade em cima da outra. Quem sabe daqui a 200 anos um buraco no local redescubra um pacote de batata chips, um CD de forró ou um telefone celular que tira fotos. E assim, os que vierem depois de nós saberão como se vivia no longínquo início do século 21.
Rodrigo Bertolotto
Do UOL Notícias
Em São Paulo



As enchentes e o patrimônio
Ano começa com fortes chuvas e destruições no país, afetando de forma irreversível o casario de São Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraíba, em São Paulo
Tragédias marcaram esse início de 2010, com as tempestades e enchentes que causaram várias mortes, deixaram vítimas e desabrigados e destruíram muitas casas, afetando o patrimônio histórico, como no caso da cidade de São Luís do Paraitinga.
As cheias do Rio Paraitinga, que subiu mais de 10 metros, destruíram a Igreja da Matriz, do século XIX, e a Igreja da Nossa Senhora das Mercês. Além disso, destruíram a maior parte dos casarões tombados da cidade. Feitos de taipa de pilão, uma mistura de barro e pedras, não resistiram às fortes chuvas. Técnicos acreditam que as construções que não caíram devem ficar com a estrutura comprometida.
A recuperação do patrimônio histórico de São Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraíba, em São Paulo, deverá implicar em um investimento alto e o tempo para a restauração deverá ser superior a dois anos. Segundo Nestor Goulart Reis, professor de História da Arquitetura da USP, a recuperação do patrimônio histórico do município poderá ser feita apenas parcialmente. "Só se pode fazer uma parte da restauração, o restante seria uma reconstrução simples. Vai contra os princípios dos restauradores fazer mutações, reconstruções simples. É claramente definido a reconstituição do que for possível", afirmou.
De acordo com Goulart Reis, a enchente trouxe um prejuízo enorme para a história, por se tratarem de prédios com projetos arquitetônicos do século XVIII. "Naquela época eles tinham regras urbanísticas rigorosas, que obrigavam os edifícios nos locais principais a seguirem os mesmos padrões, formando com isso, um dos mais importantes conjutos urbanísticos da arquitetura do Brasil", disse.
Os quase 70 casarões tombados pelo patrimônio histórico que ruíram ou que tiveram estruturas abaladas devem ser reerguidos usando concreto armado e alvenaria nas estruturas. Erguidos na época do café por meio da técnica de taipa de pilão e pau-a-pique, os casarões se tornaram muito vulneráveis durante as cheias. "O Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) permite que as estruturas sejam reforçadas, contanto que as fachadas sejam preservadas", disse o engenheiro civil Jairo Bonielo, que ajudou na reforma do mercado municipal.
Oito técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e três do Condephaat foram essa semana para a cidade, para fazer um diagnóstico da destruição. O presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, fez um apelo para que a sociedade civil colabore com a reconstrução. "Nunca antes registramos uma calamidade com essas dimensões no patrimônio histórico por causa de chuvas ou acidentes naturais", disse Almeida, com base numa análise prévia feita com fotos das enchentes.

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