ENTRESSEIO

s.m. 1-vão, cavidade, depressão. 2-espaço ou intervalo entre duas elevações. HUMOR, CURIOSIDADES, UTILIDADES, INUTILIDADES, NOTÍCIAS SOBRE CONSERVAÇÃO E RESTAURO DE BENS CULTURAIS, AQUELA NOTÍCIA QUE INTERESSA A VOCÊ E NÃO ESTÁ NO JORNAL QUE VOCÊ COSTUMA LER, E NEM DÁ NA GLOBO. E PRINCIPALMENTE UM CHUTE NOS FUNDILHOS DE NOSSOS POLÍTICOS SAFADOS, SEMPRE QUE MERECEREM (E ESTÃO SEMPRE MERECENDO)

08 março, 2010

CULTURA, PATRIMÔNIO CULTURAL E HISTÓRICO - 8-3-10

José Mindlin - A Morte de Um Guardião da História



Talvez a única coisa que fez sem alegria foi deixar este mundo dia 28/02/2010 aos 95 anos sem ver concluído o prédio da Brasiliana USP, projeto acadêmico da Universidade de São Paulo que reúne a maior coleção de livros e documentos sobre o Brasil num edifício de 20 mil metros quadrados da Cidade Universitária sob a responsabilidade da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, órgão da Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária da USP.
Sonho maior do bibliófilo, a coleção Brasiliana, composta por 17 mil títulos (ou 40 mil volumes) de literatura e manuscritos históricos doados pelo colecionador - incluindo outra Brasiliana herdada por ele, a do amigo e também bibliófilo Rubens Borba de Moraes - é o maior legado deixado por Mindlin além da herança ética que o Brasil recebe desse empresário, jornalista, ex-secretário de Cultura de São Paulo e membro das academias Brasileira e Paulista de Letras.
Desde adolescente avesso ao autoritarismo, Mindlin começou sua carreira como jornalista, driblando a censura durante a Revolução de 1930. Outro exemplo de sua conduta ética foi o pedido de demissão do cargo de secretário de Cultura do governo Paulo Egydio quando o jornalista Vladimir Herzog foi morto pela ditadura militar, em outubro de 1975. Naquela época, espalhou-se o boato de que Mindlin era agente da KGB, o terrível serviço secreto soviético, com o objetivo de atingir tanto a TV Cultura, onde Herzog trabalhava, como o empresário.



José Mindlin e sua esposa Guita Mindlin


Posteriormente, ao ser convidado pelo governo civil de Fernando Collor para ocupar o cargo de ministro da Fazenda, Mindlin, traumatizado com cargos públicos, declinou da oferta, ocupando-se de sua biblioteca de 40 mil títulos, que manteve por mais de sete décadas com a ajuda de sua mulher, Guita, e após a morte desta, em 2006, por mais quatro anos até ficar doente. Instalada em sua casa no Brooklin, na qual morou por mais de 60 anos, a biblioteca era seu grande orgulho. Nela repousam raridades como a primeira edição de Os Lusíadas, de 1572, um original do padre Antonio Vieira, os originais de Grandes Sertões, de Guimarães Rosa, corrigidos à mão pelo autor, além do primeiro livro que Mindlin comprou num sebo quando tinha apenas 13 anos de idade, Discurso sobre a História Universal, escrito em 1740 pelo bispo francês Jacob Bossuet.
Outra preciosidade é o primeiro livro em que o Brasil é mencionado num relato de viagens de Fracanzano da Montalbodo, de 1507, que fala da viagem de Pedro Álvares Cabral. Oito décadas de colecionismo resultaram num acervo de 40 mil livros que se juntaram ao exemplar raro de Bossuet, muitos deles disponíveis para consulta pública na Brasiliana Digital, a biblioteca virtual desenvolvida com o acervo doado pelo empresário à USP, em 2006.



O empresário, então com 82 anos, mais da metade dedicados à Metal Leve, não se aposentou, participando dos conselhos de administração de grupos ou de instituições como a Sociedade de Cultura Artística, da qual seu pai foi um dos fundadores - Mindlin foi peça fundamental na campanha pela reconstrução do seu teatro, que pegou fogo em 2008 e será reinaugurado em 2012.
Filho de um dentista judeu de origem russa, Ephim Mindlin, apaixonado por música e pintura, Mindlin herdou a paixão pela cultura do pai, que costumava receber em casa escritores como Mário de Andrade. Esse contato próximo com grandes estudiosos dos problemas brasileiros o transformou em farejador de raridades ao topar, ainda adolescente, em Paris, com o clássico História do Brasil, a narrativa de frei Vicente de Salvador, de 1627, que o fez se interessar pelo passado do País. Desde então, obcecado pela ideia de construir a maior biblioteca dedicada a estudos brasileiros, aproveitava todo tempo livre em sua viagens internacionais para garimpar títulos que nem a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro sonhou em ter no acervo. Seu sacrifício pessoal rendeu ótimos títulos publicados com a ajuda de sua biblioteca, entre eles os volumes da História da Vida Privada no Brasil, cujo conteúdo foi pesquisado em sua casa do Brooklin, frequentada pelos maiores intelectuais do País.
Mecenas, Mindlin, um dos articuladores da Fundação Vitae, que concedia bolsas para a realização de projetos culturais, publicou livros de grandes amigos poetas, como Carlos Drummond de Andrade, e artistas visuais como a gravadora Renina Katz, de quem patrocinou o livro Romanceiro da Inconfidência, com ilustrações suas para a principal obra poética de Cecília Meireles. Seu acervo de obras em papel tem peças raras de artistas como Goeldi, Lescoschek, Lívio Abramo e Iberê Camargo. Modesto, o premiado Mindlin, que dirigiu o Masp e ganhou, entre outros, o troféu Juca Pato de intelectual do ano, em 1988, costumava dizer que essa escolha se devia mais à mulher Guita, com quem teve 70 anos de vida em comum e cuja paixão pelos livros a levou a aprender encadernação e fundar, em 1988, a Associação Brasileira de Encadernação e Restauro para ajudar o marido a conservar sua biblioteca - ela encadernou o primeiro exemplar (de 1810) da primeira edição brasileira de Marília de Dirceu, obra do poeta inconfidente Thomaz Antônio Gonzaga.
O negócio de Mindlin mesmo era a leitura, hábito que, infelizmente, foi obrigado a abandonar nos últimos anos por problemas de saúde. Sem visão, passou a convidar amigos e jovens universitários para ler em sua biblioteca, disseminando também o gosto pela leitura entre os empregados de sua casa e os enfermeiros que o assistiram nos últimos meses. Antes que seus olhos enfraquecessem, ele leu, porém, mais de cinco vezes sua obra preferida, os sete volumes de Em Busca do Tempo Perdido, de Proust, da qual guardava uma raríssima primeira edição francesa. Depois de Proust, Balzac ocupou sua imaginação por mais tempo. Em suas inúmeras visitas ao órgão do Banco do Brasil responsável pelas importações, o empresário da Metal Leve, obrigado a longas horas de espera nos corredores, devorou quase toda A Comédia Humana.
Nascido em São Paulo, em 1914, Mindlin estudou Direito na USP e fez cursos de extensão universitária na Universidade de Columbia, em Nova York. Aos 32 anos, financiado por um empresário, conseguiu um sócio e fundou a livraria Parthenon, em São Paulo, especializada em livros raros. A guerra havia acabado há um ano e famílias europeias descapitalizadas se desfaziam de seu patrimônio artístico e literário. Foi assim que Mindlin trouxe para o Brasil muitas raridades que colocou à venda na Parthenon, sempre alertando o comprador que poderia procurá-lo no futuro, caso quisesse se desfazer do livro. O conflito entre vendedor e colecionador cresceu com o tempo. Mindlin não resistiu e foi atrás de todos as obras raras vendidas, recomprando-as para sua biblioteca particular quando virou empresário.
Foi quando vendeu a Metal Leve, dirigida por ele durante 46 anos, que o empresário pensou no futuro de sua biblioteca. Inspirado no modelo da John Carter Brown Library, de Providence (EUA), que começou como coleção particular e hoje é uma das maiores do mundo em documentos raros sobre a América, Mindlin, que integrava o conselho da biblioteca, pensou em fazer um acordo com a USP para transferir seu acervo, resistindo às ofertas de universidades norte-americanas para vender a Brasiliana, que finalmente ficará na universidade paulista desde que o prédio que a abrigue fique pronto até 2012, condição contratual para a doação. Parte dessa história está contada no livro Memórias Esparsas de uma Biblioteca, um dos volumes que Mindlin dedicou à maior coleção privada do Brasil - os outros são Uma Vida entre Livros e Destaques da Biblioteca Indisciplinada de Guita e José Mindlin.
Sempre procurado por pesquisadores brasileiros e estrangeiros atrás de suas raridades bibliográficas, Mindlin, um cidadão do mundo que dominava seis línguas, foi um dos primeiros empresários a atravessar a Cortina de Ferro durante a Guerra Fria, tentando aproximar o Brasil de países como a extinta União Soviética. Teve papel fundamental no processo de redemocratização do País ao assinar, durante a ditadura, um manifesto pela abertura política junto a outros oito empresários.
Mindlin não colecionava livros raros por fetiche. Queria dividir o prazer da leitura com milhares de pessoas. Mesmo como empresário, que transformou a Metal Leve de uma pequena fábrica de pistões, nos anos 1950, numa empresa multinacional gigantesca do setor de autopeças - com representação nos EUA -, Mindlin buscou o ideal de uma gestão democrática em que os operários pudessem ter voz ativa nas discussões sobre seu destino. Com a globalização, a Metal Leve não sobreviveu ao assédio do capital estrangeiro e, em 1996, foi comprada por sua maior concorrente, a alemã Mahle.
O ex-libris de José Mindlin, selo pessoal que o bibliófilo colocou em sua coleção de livros raros, não poderia identificar melhor quem foi o empresário, intelectual e acadêmico morto ontem, em São Paulo: "Je ne fait rien san gayeté" (Não faço nada sem alegria). De fato, quem teve o privilégio de conhecer e conviver com Mindlin sabe que caiu bem na vida do maior colecionador de livros do Brasil a escolha dessa máxima de Montaigne, retirada de seus Ensaios (do qual sua biblioteca tem um raríssimo exemplar, de 1588, que pertenceu ao crítico Saint-Beuve).

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100301/not_imp517534,0.php



 
Rio Grande do Sul - Secretaria do Estado da Cultura coleciona controvérsias
Desde que foi criada no governo Simon (1987-1990), a Secretaria Estadual da Cultura é caudal de polêmicas que se reavivaram com fechamento de sala e demissão em Memorial
Não que tenham sido notícias bombásticas, mas o fechamento da Sala de Cinema Norberto Lubisco e a demissão do historiador Voltaire Schilling da direção do Memorial do Rio Grande do Sul, em fevereiro, parecem ter mobilizado a assim chamada comunidade cultural gaúcha.
Em manifestações públicas ou restritas, mas de tom não raro veemente e em quantidade como não se via há tempos, as reações a esses episódios lançaram holofotes sobre o papel da Secretaria do Estado da Cultura (Sedac). Pressão que deve recair não apenas sobre a atual titular da pasta, Mônica Leal, mas sobre quem a suceder a partir das próximas semanas, quando ela deixa o cargo para concorrer a deputada estadual.
A lembrar: não se viam cobranças tão fortes direcionadas à Sedac desde que, em 2007, rumores deram conta de que a governadora recém-empossada Yeda Crusius extinguiria a Sedac e, assim, uniria a Cultura à Secretaria do Turismo. Algo mudou nesse período? Os antecessores de Mônica estão entre os críticos de seu trabalho. Mas o “marasmo da cultura” – expressão usada por ambos em conversa com ZH – é pontual e localizado ou resulta de uma sucessão de políticas descontínuas e do próprio desprestígio da área no imaginário do gaúcho ou, no mínimo, dos administradores do Estado?
Um exame minimamente atencioso na trajetória da Sedac deixa claro que visões radicais, para qualquer lado, não têm fundamento. Em duas décadas, desde a criação da secretaria, graças em boa parte à atuação dos gestores das políticas culturais públicas, o Rio Grande do Sul ganhou eventos do porte de uma Bienal do Mercosul e uma legislação (a LIC-RS) que permite a injeção anual, com renúncia de ICMS, de cerca de R$ 30 milhões em projetos culturais. Mas também viu afundarem em dificuldades administrativas instituições como a Casa de Cultura Mario Quintana, além de assistir impassível às vãs tentativas de implementação de equipamentos fundamentais, entre os quais uma casa para a sua principal orquestra, a Ospa.
A Sedac foi criada no governo Pedro Simon (1987-1990), na primeira das duas gestões do secretário Carlos Appel (veja cronologia da Sedac na página 5).
– Era uma reivindicação geral da comunidade cultural à época – lembra Appel. – E era o que de melhor se podia fazer, pois a partir da secretaria se tornou viável construir uma política de atuação mais concreta.
Houve, de lá para cá, mudanças sensíveis no foco das administrações. Mas permanece a dúvida sobre se a continuidade de suas ações permite falar em políticas concretas de atuação nestas duas décadas. Diz Appel:
– O orçamento da Cultura é muito baixo. Mas quando os agentes culturais são ouvidos, as necessidades da área são estudadas e a partir disso se estabelecem focos precisos, as ações naturalmente ganham uma lógica. Hoje, por exemplo, vejo como necessária a criação de uma nova Biblioteca Pública. Você questiona a importância dada pelas pessoas ao que acontece no âmbito cultural. Se essa importância for pequena, vamos ficar parados? É tarefa do poder público virar o jogo, dando aos livros uma casa nobre, mostrando para essas pessoas a importância dos livros.
Mônica Leal sustenta que sua política cultural pode ter sido menos notada porque “primeiro teve de pôr a casa em ordem” (leia entrevista na página 6), fazendo da economia interna da Sedac uma de suas prioridades. Em sua gestão, houve mudança de sede da secretaria (do Solar Palmeiro, prédio alugado na Praça da Matriz, para o Centro Administrativo do Estado), corte de verbas e de cargos – o que fez com que instituições que engatinham, como o Museu de Arte Contemporânea, perdessem o “privilégio” de ter um diretor exclusivo. É esse enxugamento um dos pontos das críticas que sofre.
– Atualmente não há uma política cultural pública no Rio Grande do Sul – afirma Luiz Marques, que ocupou o cargo entre 2001 e 2002, no governo Olívio Dutra. – Há um descaso do governo Yeda para com a Cultura, simbolizado por uma secretária sem relação com a área. Antes as instituições tinham força, havia prêmio de cinema (Prêmio RGE), o Instituto Estadual do Livro publicava livros, havia recuperação do patrimônio histórico. Hoje tudo mudou. Não é surpresa que não se saiba o que a comunidade cultural quer, afinal, ela não é ouvida. No nosso governo, havia reivindicações, como o FAC (Fundo de Apoio à Cultura, mecanismo de incentivo direto do governo, e não de empresas com renúncia fiscal), que criamos e que segue inativo. Não se sabe quais são as reivindicações atuais da comunidade.
Mônica se defende:
– A secretaria está fortalecida graças ao saneamento de suas finanças. Os investimentos não acontecem com o caixa deficitário como o encontrei quando assumi a pasta. Deixei a Sedac em condições de ter as suas políticas culturais, com encaminhamentos imprescindíveis como o projeto de lei Pró-Cultura, que modifica todo o sistema LIC e implementa o FAC.
Duelo até na Justiça
A secretária da Cultura, Mônica Leal, chegou a depor contra Roque Jacoby, secretário no governo Germano Rigotto, entre 2003 e 2006, no processo em que ele foi acusado de fraude na Lei de Incentivo à Cultura – e do qual saiu absolvido esta semana. A secretária havia dito, ao assumir o cargo, que “sanear a lei era uma prioridade” e que o Estado “precisava de um gestor capaz de salvá-la”.
– Havia um passivo de R$ 14 milhões (dinheiro cujo repasse estava aprovado pela Sedac mas que não podia ser de fato repassado porque excedia o montante previsto pela lei). Sem uma intervenção imediata, o mecanismo ficaria impossibilitado de seguir operando – argumenta, ressaltando que não fez disso seu foco principal. – Eu quis atender aos anseios da comunidade cultural de acordo com a política do governo. Mas, da forma como encontrei a Sedac, não teria como cumprir sequer com a rotina administrativa se não arrumasse as contas.
Jacoby argumenta que o passivo era alto no momento em que deixou o governo porque vislumbrava perspectivas de que o mecanismo fosse ampliado.
– Trabalhávamos pensando num aumento da verba disponível – diz. – Além disso, é normal que parte do dinheiro aprovado não seja captado, então partir de uma quantia maior era importante para não haver desperdício. Se os produtores de fato captam mais do que está disponibilizado, temos mais condições de reivindicar esse aumento. Na nossa gestão, aprovamos a Lei Bernardo de Souza (que permite que empresas de porte menor também descontem o valor investido do ICMS), que constituía um passo concreto.
Divórcio entre pares
A cultura no Rio Grande do Sul vive um momento de divórcio entre o Estado e seus artistas. É o diagnóstico de alguns nomes expressivos que já atuaram em diferentes áreas da política cultural do Estado. Já os motivos apontados para essa falta de diálogo entre a secretaria responsável por fomentar a cultura e aqueles responsáveis por produzi-la variam. E vão de acusações de despreparo da secretária Mônica Leal para a função até a autocrítica de uma certa apatia da própria classe em se organizar e fazer valer sua oposição. Passando, é claro, pela gradual perda de importância da Cultura nas políticas não apenas deste governo, mas dos anteriores.
– Estamos realmente perdendo espaço, a cultura está encolhendo no Estado. A secretaria tem um horizonte muito amplo de atuação, folclore, literatura, música, dança, artes plásticas e me parece que em todos os setores as ações públicas estão enfraquecendo. Não se percebe projetos de grande porte. Os grande projetos culturais tocados hoje são da iniciativa privada. O próprio Porto Alegre Em Cena deve ser destacado, e é uma iniciativa da secretaria municipal. Ou seja: a Sedac não apresentou ainda um projeto, apenas eventos isoladamente importantes – analisa o jornalista Fábio Coutinho, ex-diretor do Margs.
Para quem pensa a cultura no Estado, as realizações da atual secretaria não são parte de um projeto orgânico, e sim inciativas isoladas sem conexão entre si, algo que colabora para a atual crise de estagnação, com aparelhos culturais degradados ou em fechados e programas e institutos tradicionais inativos – o Instituto Estadual do Livro (IEL) e seu minguante projeto Autor Presente são citados com frequência.
A falta de um projeto sólido para a área da Cultura não é uma acusação lançada exclusivamente ao atual governo. Já era aventada com relação a outras administrações – a última gestão, de Roque Jacoby, também as sofreu. O que intensifica os comentários a respeito do atual governo é o fato de que a comandante da Secretaria do Estado da Cultura não é uma figura política com história na área da Cultura – razão de duras críticas desde que Mônica Leal assumiu. Não apenas pela falta de familiaridade da titular com a área que gere, mas pela própria postura com relação a isso.
– Eu, respeitosamente, acho que foi um grande equívoco a indicação da secretária, algo que não serviu nem para os projetos políticos dela e nem para a área da cultura. A Cultura perdeu o seu significado no conjunto das secretarias do Estado – opina Dilan Camargo, participante da equipe da primeira gestão da Secretaria da Cultura, com Carlos Jorge Appel.
O economista e pesquisador em Economia da Cultura Leandro Valiati avalia:
– O conceito de financiamento à cultura a partir de renúncia fiscal assume que existem menores custos de transação no fato de os recursos partirem da iniciativa privada diretamente ao realizador cultural, com posterior desconto do imposto devido pelo financiador. Contudo, o problema principal desse tipo de mecanismo é que os governos têm confundido um instrumento de política cultural com a política cultural.
O que fizeram os secretários
Carlos Jorge Appel (entre 1995 e 1996)
O secretário à época da criação da Sedac e da inauguração da Casa de Cultura Mario Quintana voltou no governo Antônio Britto para substituir Mila Cauduro (secretária na gestão Alceu Collares) com a tarefa de implementar um mecanismo de patrocínio cultural com renúncia fiscal nos moldes da Lei Rouanet, que permite dedução de Imposto de Renda. Criou a Lei de Incentivo à Cultura (LIC-RS) a partir de renúncia de ICMS e saiu depois de dois anos sob o argumento de que já havia ficado muito tempo à frente da pasta.



Nelson Boeira (entre 1997 e 1998)
Intelectual de atuação respeitada na academia, trouxe para sua gestão o cientista político e hoje secretário da Justiça e do Desenvolvimento Social, Fernando Shüller, com quem havia trabalhado na Secretaria da Cultura de Porto Alegre. Sua passagem pela Sedac ficou marcada, entre outras ações, pela realização de shows e eventos de grandes proporções, aproveitando o novo mecanismo de financiamento. Também foi nesse período que a Bienal do Mercosul foi lançada e que o Prêmio RGE de Cinema foi implementado.



Luiz Pilla Vares (entre 1999 e 2000)
Secretário da Cultura no primeiro governo do PT na prefeitura de Porto Alegre, o jornalista Pilla Vares assumiu a pasta do Estado quando o partido chegou ao Palácio Piratini, com Olívio Dutra, em 1999. Sua gestão foi marcada pelo sucesso de algumas organizações, como o Margs (dirigido por Fábio Coutinho). Defendeu o fortalecimento das instituições de controle do poder público e inaugurou o Memorial do Rio Grande do Sul. Saiu depois de dois anos para trabalhar no gabinete do governador.

Luiz Marques (entre 2001 e 2002)
Defendeu o uso da LIC também em projetos menores e protagonizados por talentos jovens e menos conhecidos. Durante sua gestão, houve a criação de incentivos de menor impacto financeiro, destinados usualmente a esse tipo de projeto, como o Prêmio Iecine de cinema. Houve o restauro da Casa de Cultura Mario Quintana e a adequação do programa de descentralização da cultura implementado na Capital. A criação do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) como alternativa à LIC também data dessa gestão.



Roque Jacoby (entre 2003 e 2006)
Sua gestão, que teve início quando Germano Rigotto assumiu o Estado, coincide com a volta de Ivo Nesralla à presidência da Ospa e a divulgação dos projetos de construção de uma nova sede para a orquestra. A aprovação da Lei Bernardo de Souza permitiu a ampliação da lei de incentivo, que, em compensação, enfrentou em sua gestão sua maior crise. Foi absolvido esta semana em ação por supostas irregularidades na aplicação de recursos da Lei de Incentivo à Cultura.
Daniel Feix
daniel.feix@zerohora.com.br
Zero Hora

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